Sentou-se no banco da praça, que àquela hora estava cheia. Muitos passavam, mas ninguém parava. Todos percebiam, mas igualmente todos fingiam não perceber que a vida de Reinaldo estava se transformando ali, naquele momento, em plena luz do dia. Certamente muitos pensaram em sentar-se a seu lado, colocar a mão sobre seu ombro e dizer: “Vamos, meu jovem! Seja lá o que for isso, foi só uma decepção. Outra pessoa pode receber essas flores”.
Mas ninguém se sentou ao seu lado desde o momento em que ela se levantou daquele assento. Depois de muito tempo em sua vida, ele se sentiu sozinho. Era uma pessoa cercada de pessoas, carinho, poemas. Gabrielle lhe parecia alguém como ele. Viu em sua mente a cena de alguns meses atrás, quando a moça abriu o bombom vermelho que ele havia dado. Lembrou-se de querer dizer a ela que aquele chocolate não era necessariamente recheado com licor de cerejas. Era um recheio especial. Não sabia se ela entenderia, então se calou.
E calou-se por muito tempo. Calou-se quando a sentiu chorar em seus braços. Calou-se quando a viu gritar, instigada de raiva contra ele. Calou-se quando ela disse que o amava. Calou-se quando ela disse que ele era seu melhor amigo. Calou-se quando ela contou a ele sobre suas paixões. Calou-se diante dos vícios. Calou-se diante dos risos. Calou-se quando brincaram.
Viveu calado. No fundo, era um rapaz solitário. Mas isso não o incomodava. A solidão acompanhada era algo que Reinaldo amava. Com o olhar marejado, viu dentro de si ainda a memória viva, daquele mesmo dia, quando se animou a propor a Gabrielle que dividissem suas solidões. Comprou rosas, o mesmo bombom de sempre, penteou os cabelos para o lado, colocou a melhor roupa que tinha naquele armário repleto de camisas pretas, listradas e xadrez.
Quis que aquele dia fosse uma grande surpresa. De uma forma ou de outra, suas expectativas não foram frustradas. Surpreendeu-se. Nunca havia visto uma negativa como aquela. Uma explicação completamente confusa, pronunciada por uma boca que esboçava um sorriso. Ele a conhecia. Sabia que aquele sorriso não expressava felicidade. Ela sempre fazia isso quando não sabia o que fazer. Era o mesmo sorriso que ela dera quando ele a convidou para entrar na roda-gigante. Foi o mesmo sorriso que ela deu na fila e quando os dois estavam lá em cima. Ela chorava pela sua fobia, mas o sorriso embaraçado não deixou seu rosto nem quando ela pegou a mão de Reinaldo e apertou com muita força.
Não sabia quando sentiria aquela mão de novo, ou aquele abraço depois de alguma grosseria involuntária qualquer. Naquele momento entendera Adão e Eva, e se solidarizou com o casal. Todos os condenam por terem mordido justamente o fruto proibido, diante de um paraíso e um pomar natural formosamente diversificado. Mas... E se eles tivessem simplesmente se enganado, se confundido? Ou então, e se tanto Eva quanto Adão tivessem se apaixonado por aquela árvore? Que haveriam de fazer? E se os outros frutos não tivessem mais sabor? Se sua teoria porventura se comprovasse um dia, seria uma injustiça histórica o fato de Adão e Eva terem que enfrentar a saída do paraíso unicamente por darem vazão às suas paixões, que podiam ser as mais belas.
Foi então que Reinaldo descobriu-se casado com a estabilidade, mas amante do movimento, mesmo que desgraçado. Sentiu isso quando viu sua maçã sair correndo da praça, de capuz, para que ninguém visse que chorava. Ela ainda olhou para ele, como se implorasse para que ele entendesse que sua negação era motivada unicamente por um amor tão grande que nem ela mesma compreendia. Não quis amá-lo por amá-lo demais. Talvez fosse aquilo que o último olhar de Gabrielle quis lhe dizer. Talvez ainda fosse um pedido desesperado para que ele largasse as flores, corresse até ela e gritasse para que voltasse.
Mas ele simplesmente calou-se.
.Por Gustavo Marin.